Mais de um ano depois de ter sido provavelmente o primeiro jornalista brasileiro a ter em mãos o Nike+ SportWatch GPS, então apresentado em uma feira de informática em Las Vegas, finalmente testo o relógio com GPS da gigante do vestuário esportivo.
Confirmo minha impressão inicial: o aparelho é uma belezinha, bem de acordo com meu gosto espalhafatoso. Tem pulseira larga, preta com fundo verde-limão, e a tela é de boa qualidade, com algarismos gigantes quando na função relógio e de bom tamanho quando usado para seu objetivo principal –registrar os indicadores do treino, como distância percorrida, ritmo desenvolvido e tempo decorrido.

Ele usa GPS da Tomtom, que funcionou bem em todos os meus treinos. Mesmo na primeira saída, levou cerca de 30 segundos para encontrar o satélite; em um dos treinos, ficou pronto em dez segundos. O aparelho teve uma certa ajuda, digamos assim, pois saí da mesma região em quase todos os treinos; tentei dificultar, porém, ficando algumas vezes sob árvores ou perto de telhados.
As funções dele são acessadas e comandadas por três botões: dois iguais, pretos, são navegadores, passando o cursor para cima ou para baixo, e o terceiro, grande e verde-limão, é o de ok, para confirmar a seleção feita. O SportWatch também responde a toques na tela, para acionar a luz de fundo ou marcar volta (nem tentei fazer isso; usei sempre o recurso de volta automática, que registra o tempo de cada quilômetro –ou outra distância desejada).
Os botões estão no lado esquerdo do relógio, o que torna o acesso a eles e seu acionamento um tanto desconfortável e mais lento do que se estivessem do lado direito. Usei o relógio em mais de dez treinos, e cada vez que ia acionar algum botão tinha de pensar no que fazer (Uso o indicador? O dedão? Passo a mão por cima ou por baixo do relógio?).
Claro que isso é uma questão de adaptação. Mas não entendi porque a Nike optou por esse posicionamento dos botões, uma vez que, segundo me diz a Wikipédia, apenas cerca de 10% da população mundial é canhota.
De qualquer forma, isso me incomodou menos do que o fato de que a informação principal mostrada na tela tem de ser determinada por software, quando o relógio está conectado ao computador. Ou seja, não pode ser definida diretamente no relógio.
Explico melhor. Quando em modo corrida, a tela do relógio é dividida em duas áreas. Na maior, com cerca de 4/5 do espaço, fica a informação que você considera principal –em geral, distância ou tempo, mas você pode optar por outros indicadores, como ritmo. Essa definição precisa ser feita pelo software que faz o carregamento dos dados para o site da Nike onde eles ficam arquivados. A aba Configurações (veja tela abaixo) dá acesso à guia Personalizar, pela qual você determina se a tela terá números brancos sobre fundo preto ou o contrário, e qual a estatística favorita. As demais (ritmo, calorias etc.) são relegadas à área que sobra, no alto da tela; se você desejar, podem ficar passando automaticamente, como se fossem notícias em um painel eletrônico.
Isso me incomodou. Faço treinos por distância e por tempo, e precisava me lembrar, à noite, de reprogramar o relógio conforme o plano do dia seguinte. Aliás, o usuário também não tem o controle total sobre a apresentação das estatísticas da corrida. Quando peço os tempos de cada km, eles vão passando automaticamente, e eu não consigo me deter em uma volta para analisar melhor aquele desempenho específico.
Em contrapartida, o relógio é totalmente festivo. Se você quiser, ele o cumprimenta a cada treino mais longo ou mais rápido. Também manda mensagens de aviso e incentivo, se você deixar essa opção ligada. E tem um registro de recordes, outra função para lustrar o ego do usuário.
Durante os treinos, o SportWatch só se comportou mal uma vez. Registrou um km feito em 51min12 (!). A marcação de quilômetros parou enquanto o cronômetro e eu continuamos correndo. Os quilômetros anteriores foram gravados com tempo certo, cada um feito em cerca de 7min40.
Na hora de fazer a comunicação do relógio como computador e, especialmente, com a internet, foi um desastre. Duas vezes só se conectou ao computador depois de várias tentativas, mandingas, reza braba, sopros e passagem de paninho nos conectores.
Parênteses: a saída USB do relógio fica embutida na pulseira; basta dobrar uma das pontas para que a lingueta eletrônica apareça. Isso me parece um bom achado de design e, pelo que vi, a lingueta fica bem protegida de suor e poeira (foto).

Ela pode ser ligada diretamente a uma porta USB, mas há também uma pequeno cabo que serve de comunicação entre o relógio e o computador –às vezes, é útil. Eu preferi usar o cabo, para não deixar o relógio pendurado na CPU de meu computador.
Bom, volto à via-crúcis da conexão. Além daqueles dois testes de minha paciência, em outra oportunidade o relógio falou imediatamente com o computador –o que ficou claro porque apareceu na tela a imagem de uma bateria, indicando que ele estava sendo carregado–, mas não acionou o software para carregar os dados no site da Nike (foto).

Outro parênteses. Agora, com essa história de computação em nuvem, virou moda arquivar os dados do seu relógio com GPS apenas no site do fabricante –com o MotoActv, já testado por este blogueiro, também é assim. Isso é muito bom, porque é possível consultar os dados usando qualquer computador ou outro aparelho conectado à internet. Em contrapartida, o usuário fica totalmente dependente da operação do site do fabricante, o que não me deixa muito à vontade, para dizer o mínimo. Os primeiros GPS que usei vinham com um programa que armazenava todos os dados no computador. Além disso, era possível transmitir os dados para um site, interagir com outros serviços (como o Google Earth) e outros internautas. Mas isso é outra história…
Na maior parte das vezes em que liguei o relógio ao computador, as coisas funcionaram bem. Ele carregou os dados para o site e abriu a janela do NikeRunning para que eu fizesse meu login. Isso feito, imediatamente apresentava na tela o balanço geral do último treino realizado (veja abaixo).

E aí, mais uma vez, ocorreram problemas. Apesar de obviamente o GPS ter funcionado tanto durante o treino (o relógio marcou a quilometragem realizada, o ritmo por km etc.) quanto ao passar os dados para o site (aparecia a mesma quilometragem realizada), várias vezes o site NikeRunning dizia não ter recebido os dados de GPS para montar o percurso do treino. Na metade dos treinos realizados neste teste, esse processo não funcionou.
O trajeto gerado com base nos dados do GPS é vital para que o usuário tenha acesso a algumas estatísticas. Quando o mapa aparece, surge um quadro que mostra o tempo de cada volta (na primeira tela, também dá para ver o tempo das voltas, mas apenas uma de cada vez). Os dados de altimetria –ainda que pouco úteis da forma como são apresentados—também só ficam disponíveis com o carregamento do mapa (abaixo, uma tela completa).

Em alguns dos treinos, o mapa não carregou imediatamente –nem na segunda, nem na terceira vez em que acessei o site–, mas dois ou três dias depois apareceu. O que deixa claro que os dados haviam sido transmitidos do relógio para o site, mas este não foi capaz de administrá-los adequadamente e em tempo hábil. Afinal, quando o usuário passa os dados para o site quer ver a informação na hora, e não dois dias depois.
Bom, quando o mapa carrega aparece também um gráfico que mostra a relação entre a velocidade desenvolvida e a altimetria do percurso. Para mim, esse gráfico foi um dos elementos mais irritantes de tudo o que o site apresenta. A razão: ele mostra que o sistema tem dados úteis para oferecer ao usuário, mas os apresenta de uma forma totalmente inadequada. Não dá para saber qual a altitude em cada ponto ou a cada km, muito menos a velocidade em cada ponto –além de o gráfico ser ridiculamente pequeno, não tem números (como você pode ver ao lado).
A numerália é apresentada em tempo real. O que significa isso? Quando você clica no gráfico, um cursor laranja (indicador da velocidade) começa a andar sobre um fundo cinza (a altimetria); abaixo do gráfico, um quadro mostra, a cada instante, em que velocidade você estava naquele ponto e qual a altitude do local. Considere uma maratona e imagine quantas vezes você teria de ver o gráfico em operação para decorar a altitude do km 27 ou do km 38…
Para piorar as coisas, tudo funciona de forma muito lenta. Parafraseando aquele dito que afirma que as coisas não são caras, a gente é que ganha pouco, alguém pode argumentar que o site não é lerdo, a rede da minha casa é que não presta.
Aliás, questionada sobre o assunto, a Nike respondeu: “Na maioria das vezes, o problema está na conexão de internet, que não é boa”.
De fato, a internet na minha casa é devagar quase parando; minha conexão de 2 Mbps às vezes chega a 2,5 Mbps por muito favor, mas não passa disso. Também é fato, porém, que ela é igual ou superior à velocidade da conexão de 63,3% dos usuários domésticos de internet neste país (Ibope, jan. 2012).
Outra coisa: o abrasileiramento do site não está completo, misturando guias em inglês e em português (veja abaixo). A mim, isso dá impressão de desleixo.

Independentemente desses problemas, o site é festivo e amistoso. Tem botões para conexão automática com redes sociais (se seu treino carregar, vai direto para sua página no Facebook ou Twitter) e oferece a possibilidade de etiquetar cada treino com ícones indicando sua avaliação do desempenho ou as condições do treino (veja abaixo).
A bateria é recarregável e recebe energia cada vez que o relógio é conectado ao computador. Uma carga completa, diz a Nike, dura até nove horas com GPS; em modo relógio, até 70 dias. O SportWatch tem memória para 20 corridas; segundo a empresa, quando você faz a 21ª, as anteriores são deletadas automaticamente, liberando a memória interna do aparelho.
O GPS da Nike chega às lojas brasileiras por R$ 999,90. Nos EUA, custa US$ 199 (R$ 360). Ele pode ser usado também como frequencímetro, pois reconhece uma faixa de monitoramento cardíaco desenvolvida pela Polar especialmente para a Nike. É um acessório vendido separadamente. No Brasil, o preço sugerido é R$ 249; na Amazon, está por US$ 59,99. Ou seja, completo o SportWatch custa US$ 260 nos EUA. Para comparação, um Garmin Forerunner 405CX, também com monitor cardíaco, é encontrável na mesma Amazon por US$ 179,99.
Resumo da ópera: a Nike fez um flamante relógio com GPS, que deve agradar a muita gente, apesar dos problemas aqui relatados. Ainda precisa trabalhar no site para que ele seja mais útil e eficiente. O preço está dentro do praticado tanto nos EUA quanto aqui, mas o custo/benefício é pior do que o de alguns concorrentes, especialmente por causa do comportamento irregular do site.