Tênis da Nike falha, e queniano vence em Berlim com bolhas e sangue nos pés
28/09/15 11:48
No início, nem telespectadores nem narradores nem observadores da maratona de Berlim conseguiam entender direito o que estava acontecendo com a passada do queniano Eliud Kipchoge, candidato a recordista mundial.
O pé esquerdo abria para o lado esquerdo e era batido no chão fora do ritmo controlado e firme do corredor; o pé direito apontava para a frente e chegava ao chão com outra balada.
Finalmente as câmeras se aproximara o suficiente para que todos pudéssemos ver o que continuava parecendo inacreditável: as palmilhas acolchoadas do tênis de corrida estavam saindo para fora do calçado, uma imagem até então jamais vista em uma maratona. Ou, pelo menos, nenhum dos narradores e comentaristas do mundo digital conseguia se lembrar de algo semelhante.
O desastre aconteceu por volta do quilômetro 16 e, ao longo dos dois ou três quilômetros seguintes, Eliud Kipchoge tentou dar um jeito, procurou consertar a passada.
A palmilha do pé esquerdo voava para o lado direito, e a palmilha do pé direito, também desgovernada e no ar, apontava para o mesmo lado. Ambas haviam escapado, aparentemente, resvalando por trás do calcanhar.
Por consequência, ao longo da corrida, a palmilha voadora do pé esquerdo passava perigosamente perto da panturrilha direita –se chegava a roçar a pele não dava para perceber na imagem, mas era evidentemente um risco.
Os pés, de qualquer forma, estavam sofrendo muito com o aumento do impacto –afinal, o calçado especial perdera exatamente sua parte acolchoada.
O resultado foi sofrimento e dor para o atleta, que estava em ritmo de recorde –fez a primeira parte d aprova alguns segundo pior do que a passagem do recordista mundial, Dennis Kimetto, mas sua história de corredor indica que teria condições de reduzir o tempo na segunda parte.
“Não foi fácil”, disse ele depois da prova, Segundo registro da edição norte-americana da “Runner`s World”. “Há várias bolhas no meu pé esquerdo e um corte no meu dedão, que está bem ensanguentado”, afirmou.
Apesar do sofrimento, Kipchoge nem sequer tentou, ao longo da prova, arrancar as palmilhas. “Eu estava com dores, mas o que eu podia fazer?”, perguntou ele. “Eu precisava terminar a prova.”
Depois do km 30, quando o último coelho já tinha abandonado seu trabalho, ficou claro que o recorde seria uma tarefa muito difícil, mesmo para alguém capaz de fazer, àquela altura, um quilômetro no alucinante tempo de 2min42.
Caso parasse, não só certamente não conseguiria o recorde –que acabou não acontecendo—como poderia perder o título, que conquistou com o bom tempo de 2h04.
Assim, Kipchoge, que havia sido segundo lugar em Berlim em 2013, quando Wilson Kipsang estabeleceu novo recorde mundial, escolheu seguir com dor mesmo, enquanto o mundo comentava suas palmilhas saltitantes.
Nas redes sociais, houve até quem criasse teorias da conspiração, acreditando que tudo não passaria de uma manobra de marketing da Nike, fabricante do calçado do queniano. Considerando o pouco que se sabe sobre as manobras da publicidade esportiva, a tese logo ganhou apoiadores.
A Nike, porém, não quer saber de brincadeiras. Segundo a empresa, houve uma falha, e ela será consertada.
“A cola das palmilhas não grudou direito”, disse Kipchoge. “É um bom calçado de corrida, e eu já o havia testado em treinos, mas isso acontece no esporte. Tenho de aceitar. Acho que, sem o problema, conseguiria correr mais rápido, mas não sei qual seria o meu tempo.”
A explicação dada por Kipchoge é estranha, pelo menos considerando todos os tênis de corrida que tenho e já tive ao longo de meus 17 anos de corrida: em nenhum deles a palmilha era colada.
Quanto à Nike, um porta-voz da empresa, citado pelo “Wall Street Journal”, afirmou: “Como já acontceu em corridas anteriores, Eliud estava testando um protótipo de tênis de corrida no qual vimos trabalhando juntos por vários meses. Como acontece com qualquer protótipo, às vezes alguma coisa pode dar errada. Como em todas as inovações, nós vamos aprender rapidamente com nossos erros.”
Não foi a primeira vez que um calçado da Nike dá problema em maratonas importantes. Em 1997, os cadarços do tênis usado pelo queniano John Kagwe desamarraram três vezes ao longo do percurso da maratona de Nova York. Ele venceu, mas não conseguiu o recorde. Na ocasião, a Nike decidiu pagar ao atleta o bônus de US$ 10 mil que ele teria recebido caso tivesse feito a melhor marca da história.
Até agora, não foi divulgado se haverá algum tipo de reparação para o atleta ou se o fato será considerado simplesmente um acidente de percurso –a declaração do porta-voz da Nike leva a crer que a segunda hipótese é a mais provável.
Também não foi divulgado se os representantes do atleta e seus patrocinadores concordaram com a solicitação feita pelo diretor da prova. Segundo registro da “Runner`s World”, Mark Milde gostaria que as palmilhas de Kipchoge ficassem guardadas para sempre no museu da maratona de Berlim.