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Rodolfo Lucena

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Perfil Rodolfo Lucena é ultramaratonista e colunista do caderno "Equilíbrio" da Folha

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Depois de cirurgia na cabeça, corredor enfrenta 250 km na altitude do Equador

Por Rodolfo Lucena
05/08/15 09:46

Hoje trago para você um texto do ultramaratonista CARLOS DIAS, que nos conta, dia por dia, como foi sua jornada de 250 quilômetros pelas montanhas do Equador. Sem mais delongas, segue o relato de DIAS.

Foto Arquivo Pessoal — Carlos Dias durante jornada de 250 km no Equador

 

“Quando decidi ir correr nas montanhas do Equador, tinha em minha cabeça as montanhas do Nepal, onde corri 103 km em quatro dias, em 2011.

Naquela ocasião, não aguentei ficar os sete dias na altitude, abandonei a  prova sem cumprir a meta que eu tinha me proposto.

Mas voltei do Nepal com uma lição: correr na altitude era um exercício mais mental que físico. Os anos passaram, e agora eu tive no Equador a oportunidade de cumprir a minha meta de completar os 250 km em sete dias em altitude.

Comecei o ano com um desafio intenso, corri 42 maratonas em 42 dias, expondo o meu corpo ao máximo de exigência possível para poder chegar ao Equador o mais preparado possível fisicamente e mentalmente.

Faltando quarenta dias antes da grande largada, sofri uma agressão covarde, por racismo. Fui submetido a uma cirurgia na cabeça, fiquei por pelo menos 15 dias em repouso, tomando antibióticos e perdendo muito em resistência física.

Mesmo assim, não desisti do projeto. Cheguei a Quito, cidade a 2.980 metros de altitude, cinco dias antes da largada, para uma aclimatação na altitude. De cara, porém,  senti os efeitos da altitude, tontura, enjoo e insônia.

No dia 25 de julho seguimos rumo ao primeiro acampamento no sopé do Vulcão Cotopaxi, a 3.350 metros de altura e muito frio. Passei a primeira noite, tentando respirar, as roupas me protegeram do frio mas não do cansaço imposto pela altitude.

 O meu primeiro dia de corridafoi um verdadeiro curso para aprender a andar. A largada  já começou com uma longa subida, e os passos sendo cortados, com um vento gelado no rosto, me fazendo reforçar a cada minuto minha determinação.

Acordei para o segundo dia com mais vontade de melhorar meu desempenho. Nesse dia o paratleta Vladmi Virgilio teve um colapso e foi socorrido ao hospital, saindo da prova. Seguimos com dois brasileiros na prova, eu e a Jane Carvalho, de Salvador, mas o segundo dia foi ainda mais difícil, corremos pelo vale de vulcões, trilhas e longas subidas com canyons.

Chegamos a 3.600 metros de altura, senti momentos de tonturas, outros de enjoo, muitas vezes as pernas simplesmente não respondiam ao meu comando, o choro vinha, pois achava que não conseguiria terminar a etapa, procurava manter firme meu entusiasmo, ajudando um atleta aqui outro ali, e quando chegava aos check points acionava os staffs com brincadeiras, mesmo que no momento eu estava vivendo um dia de muita dor.

O terceiro dia foi um sobe e desce incrível, e finalmente enfrentamos o caminho inca, uma trilha fina fincada em paredões gigantescos, onde um erro, poderia nos levar a uma queda fatal. Nesse  dia meu corpo, me deu uma trégua e consegui correr melhor, mas de forma cautelosa para não ter uma acidente, e preservando meu corpo para os dias extremos que tinha pela frente.

No quarto dia, o mais difícil, na minha concepção, começamos correndo em um vale, florestas, cruzamos um rio gelado e subimos uma trilha pesada, que parecia não ter mais final.

Quando chegamos ao topo dessa trilha, estávamos apenas na metade para subir a trilha do Vulcão Quilotoa com  uma cratera gigantesca com água cor verde esmeralda, a subida lenta e gelada, com ventos fortes, nos cortando a pele.

Depois de circular a cratera chegando a quase 4.000 metros de altura, começamos a descer uma trilha entre florestas e cheias de areias e pedras, que me fez cair por três vezes, e a forçar todas as minhas articulações de joelho, tornozelo e pés. Ao chegar no acampamento  o enjoo cresceu, fiquei mais fraco, e tenso pois o dia seguinte era a etapa longa.

O quinto dia chegou, e seria longo, mais de 60 km para cumprir, e mais subidas e descidas. Fui cantando, na trilha, focado em chegar bem; nesse dia passamos por fazendas, me integrei com as pessoas, procurei buscar em minha mente momentos de alegria, na minha vida, e isso me trazia momentos leves, esquecendo um pouco o cansaço e as tonturas, começamos a percorrer a florestas de nuvens, que não dava para enxergar nada pois o nevoeiro era fortíssimo, me assustava com os cachorros das fazendas e outros pequenos animais da floresta. A noite chegou e com ela a lua cheia, comecei sozinho na escuridão da floresta, que pulsava em vida, com corujas, sapos, gambás e outros tantos bichos com tantos ruídos.

O meu maior companheiro foi o rio, que descia a montanha ao meu lado e a cada passo ia mostrando sua força, com um barulho incrível da água batendo em rochas a sua frente.

Por algumas horas tive como companhia, os amigos da Coréia do Sul Elizabeh e Tong shing, depois voltei a seguir sozinho na trilha e cheguei ao acampamento às 2h 55 min.

Foi uma emoção enorme, ali eu sabia que tinha conseguido superar todas as minha fraquezas e a força da altitude do Equador.

A última etapa era a mais curta, cerca de 11 km, mas cheia de obstáculos, a cabeça  só pensava em chegar, e não importava se tinha um rio, uma subida, uma ponte fina, ou uma descida difícil.

A verdade era que eu estava pleno de felicidade e disposto a chegar para conseguir celebrar com todos os amigos construídos na trilha.

E o dia 1 de agosto não irá sair da minha mente, levantei, meditei, pois foi o dia que fazia cinco anos da morte da minha mãe. Seguir pela trilha lembrando, todos os momentos superados para chegar até aquele dia. e quando vi me deparei com a chegada e a festa de todos na cidade. Foi um grande alívio.

Terminei o percurso de 250 km em altitude, com 63 horas, a minha colocação geral foi 112º lugar. Mas o meu maior êxito foi me manter na trilha até o final sem ter nenhuma lesão e nenhuma bolha.

O campeão no masculino foi Ake Fagereng da Dinamarca com 27h15 min  e no feminino Sarah Sawyer  da Inglaterra com 35h25.

A noite, na cerimônia de premiação eu estava junto com outros atletas na mesa celebrando, a jornada.

E muito feliz com minha medalha, na altitude, quando ouvi meu nome ser chamado pela organização da prova.

Foi um momento incrivelmente mágico, todos se levantaram e aplaudiram entusiasmados, eu andei da minha mesa até o palco, com a respiração sufocada pela emoção, e o choro desceu de forma abundante. Eu estava recebendo um  troféu muito especial, o Troféu Spírit Awards  pelo espírito esportivo em momentos extremos, e por ser solidário aos atletas em momentos de adversidade na trilha.”

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