Fisioterapeutas recomendam uso de kinesio tape em casos específicos
23/06/14 08:47A entrevista com o professor Leonardo Costa, publicada na semana passada aqui neste blog provocou polêmica.
Como você se recorda, ele coordenou uma pesquisa que analisou os estudos feitos no mundo acerca da eficácia do kinesio taping, a terapia que emprega uma espécie de fita gomada colorida no tratamento de lesões musculares.
O resultado foi não apenas de que não há comprovação científica dos benefícios da fita; o estudo demonstrou que o KT não funciona.
Para o leitor Mark Hudson, fisioterapeuta, a matéria publicada “é de extrema irresponsabilidade”. Segundo ele, que comentou o texto aqui no blog, “existem vários estudos e esse é apenas mais um”.
“Existem técnicas diferentes de aplicação com intuito de reduzir a dor, reduzir edema e melhorar a circulação, para reposicionamento articular e as técnicas para inibir ou estimular a ação muscular; de todas essas, somente a última tem resultado questionável, clinicamente falando.
Temos que lembrar que é uma técnica relativamente recente e que muitas pessoas fazem aplicações de forma errada e em seguida testam, é claro que vai dar um resultado que não condiz com a realidade. Existem muitas dúvidas ainda em relação à quantidade de tensão colocada na fita, que, na prática, mostra resultados variados.”
Buenas, para fazer a reportagem publicada na semana passada na Folha, entrevistei vários fisioterapeutas e outros especialistas do mundo das corridas. Eles deixaram claro que, na prática, a teoria é outra, como diz o ditado popular. Ou seja, apesar de não haver comprovação científica da eficiência da terapia, há casos em que pacientes dizem melhorar com o KT.
A seguir, coloco os principais trechos de algumas das entrevistas que fiz.
Começo com o fisioterapeuta HÉLIO NICHIOKA, 41, coordenador técnico do Instituto Vita. Especializado em ortopedia, traumatologia e medicina tradicional chinesa, já tratou atletas olímpicos como Diego Hypolitto, Daiane dos Dantos, Natália Falavigna e Leandro Guilheiro.
O senhor recomenda o uso do kinesio tape? Por que?
Eu recomendo seu uso em casos bem específicos. Em casos em que o paciente tem muita dor, observo na clinica diária que uma parte deles refere um bom alívio nas dores.
[Pode ser aplicado] em pacientes mais ativos, mais jovens e não diabéticos, uma vez que o adesivo deve ser tolerado pela pele, e pessoas mais velhas tendem a ter uma pele mais frágil (o que facilita o surgimento de lesões cutâneas); em diabéticos há o risco maior disso acontecer com um tratamento difícil e indesejado. Todo o meu uso atual esta embasado em experiência clinica. Há carência de estudos até pela novidade da KT, e a ciência tem a sua própria velocidade. Recomendo seu uso em casos onde há uma analgesia importante com o uso da KT –a fratura de costela, por exemplo, é uma lesão extremamente dolorosa e que responde bem ao uso do adesivo com melhora do paciente quase que instantaneamente.
Em que casos o senhor aplica o KT?
Fraturas de costela, epicondilites laterais do cotovelo (o cotovelo do tenista), lesões musculares, etc. Lembro que o KT NÃO TRATA o paciente. Eu acredito no adesivo como um suporte analgésico ao paciente até ele sair da lesão, principalmente na sua fase mais dolorosa…. O tratamento envolve um espectro mais amplo de recursos e técnicas. Há relatos de uso em edemas, para “aumentar” a força e a resposta muscular, para “inibir” uma contração muscular. Eu vejo ainda estes usos FANTASIOSOS e sem fundamento biomecânico/fisiológico
Que resultados o senhor já teve?
Já obtive ótimos resultados como melhora substancial da dor imediata do paciente, melhora da função nas atividades do dia a dia. Houve também muitos casos em que o paciente relata melhora zero, onde não há qualquer alteração do quadro nem para melhor nem para pior.
Em que estudos científicos o senhor baseia o uso do KT?
Não baseio em estudos, apesar de buscar uma atuação fisioterapêutica EMBASADA, seguindo guidelines internacionais em revistas de alto impacto. Nãoo há ainda qualquer evidência de que a KT tenha seu uso apoiado de maneira sistemática em lesões ortopédicas. Eu aplico pela experiência clinica dos resultados bons e ruins do dia a dia, e entendo que o adesivo é realmente mais uma ferramenta para suporte analgésico ao paciente além do uso no alto rendimento como suporte. Lembro que a mesma carência de suporte científico é observada no caso de palmilhas esportivas e joelheiras/cotoveleiras e outros acessórios largamente utilizados.
O senhor conhece estudos científicos que demonstrem a ineficácia do KT?
Os estudos disponíveis atualmente não recomendam o seu uso e eles estão em pequeno número ainda. A grande vantagem da KT é que, pelo menos no Brasil, é o primeiro adesivo disponível para uso em humanos com alguma qualidade no material e na fabricação.
PEQUENO INTERVALO
Agora a entrevista é com a fisioterapeuta PAULA SOUSA, especialista em fisioterapia esportiva, com formação e aprimoramento em técnicas de terapia manual e postural (RPG, Mulligan, Maitland, ATM, Kinesio Taping, Estabilização Segmentar). Sócia-proprietária da Solus Fisioterapia, atendeu a seleção brasileira de kung fu de 2007 a 2011
Vamos às respostas dela.
A senhora recomenda o uso do kinesio tape? Por que?
Baseio muito minha pratica clínica nas pesquisas cientificas, mas não posso deixar nunca de observar e confrontar a minha prática com os estudos. Na grande maioria das vezes em que aplico algumas técnicas, como a KT, levo muito em conta a segurança e o conforto do paciente/atleta. Para mim, a melhora dele esta sempre em primeiro lugar; se faz bem a ele, dou-lhe todas as ferramentas disponíveis, se não responde bem ou é indiferente, não coloco como protocolos.
Sabemos que o uso da KT depende exclusivamente da adaptação positiva de cada paciente/atleta, como não fazer alergias ou irritações na pele, ou se sentir atrapalhado com uma bandagem que se solta com o suor ou cremes ou atrito com o material esportivo, durante o treino e principalmente competições. Alerto também para o alto custo da bandagem e o uso do paciente como marketing.
Para os próprios atletas, às vezes indico as que já são recortadas e de simples orientação, SE ele for para competições em que eu não consiga dar suporte e SE este paciente mostra mais segurança com elas.
Em que casos a senhora aplica o KT?
Utilizo em casos que apresentam hematoma e edema, há comprovação científica e clínica do descongestionamento sanguíneo e da linfa, com o consequente alívio da dor causada pela compressão que esses líquidos fazem nas estruturas locais. Também observo um bom aproveitamento nos casos em que há uma baixa consciência corporal, ou seja, aprendizado e manutenção do bom posicionamento articular. O feedback sensorial proporcionado pela KT mantém o que se ganha com os exercícios do programa de reabilitação entre uma sessão e outra, otimizando o processo de evolução.
Que resultados a senhora já teve?
Os resultados da KT dentro do programa de reabilitação são em sua maioria de suporte sensorial e psicológico. Como não podemos ignorar o fato de que a parte psicológica do ser humano é fator fundamental para performance em qualquer que seja sua empreitada, se posso auxiliá-lo nisso, o faço. Como resultados físicos comparados a olho nu, o mais eficiente é o descongestionamento de hematoma.
Em que estudos científicos o senhor baseia o uso do KT?
Minha base de dados são artigos científicos publicados em revistas importantes da nossa área. Procuro não me ater a leituras patrocinadas pelas marcas que estão sendo testadas, esses artigos tem aos montes na internet e são obviamente, sugestivos.
A senhora conhece estudos científicos que demonstrem a ineficácia do KT?
Li dois ou três artigos, dentre as centenas que já existem sobre o assunto, mostrando não exatamente a ineficácia, mas falta de comprovação. Nesse assunto há muito marketing envolvido, muita distorção da aplicação, desde a técnica até o momento em que se usa.
PARA COMPLETAR, A FALA DO TREINADOR
Conversei também com NÉLSON EVÊNCIO, presidente da Associação dos Treinadores de Corrida de São Paulo.
A seguir, o depoimento dele.
“Já usei algumas vezes o kinesio taping. A primeira porque tinha uma dor na famosa b anda iliotibial (parte lateral da coxa). Me senti muito bem, com mais firmeza na articulação e nenhuma dor. Corri um treino longo de 30 km e a Maratona de Berlim usando a bandagem, e a dor lateral não apareceu em nenhum momento. Outras duas vezes que utilizei foi quando pisei em raiz de árvore correndo na trilha do Ibirapuera e torci o tornozelo. A fisioterapeuta aplicou e deixou a articulação mais firme, permitindo que eu treinasse normalmente.
“Recomendo, sim, o uso, mas desde que antes a fisioterapeuta avalie a necessidade e aplique, pois se a pessoa não souber aplicar, não terá efeito.
“Já li alguns artigos que dizem que funciona e outros que não há comprovação científica. Segundo o criador da técnica, a aplicação correta produz diminuição da dor e da sensação de desconforto; promove suporte durante a contração muscular; diminui a congestão do fluxo linfático, assim como extravasamento sanguíneo subcutâneo; ajuda nas correções dos desvios articulares; promove auxílio na contração muscular; promove estímulos, aumento da propriocepção.
“Eu aprovei na prática! O importante é que uma fisioterapeuta especializada aplique, pois, se não aplicar direito, não surte efeito.”
Agora sim!
Parabéns pelo complemento da matéria e aos bons fisioterapeutas que, antes de utilizar qualquer técnica que seja rotulada como milagrosa, sabem avaliar o paciente e suas necessidades.
A fisioterapia está em constante crescimento e não vale perder tempo com radicalismos dizendo que uma técnica sozinha é melhor que uma boa avaliação.
Acho que qualquer coisa que se fale entre KT e ciência provoca atritos pois é visto como um afronte a prática clínica dos fisioterapeutas, especialmente no Brasil. Muitas técnicas da fisioterapia já passaram, estão passando e ainda devem passar por isso, mas não com toda essa supervalorização. Temos 5 revisões sistemáticas em revistas bem referenciadas para a fisioterapia que dizem que o KT não funciona e ao mesmo tempo milhões de fisioterapeutas que discordam. Quem está certo? No meu entendimento e sempre aprendi essa frase: a clínica é soberana. Sim, com certeza. Mas, se a fisioterapia brasileira quer aumentar a sua qualidade, tem que aprender a valorizar suas próprias pesquisas e pesquisadores. Aposto que se um pesquisador super famosos fizesse os estudos polêmicos sobre o KT, iriamos aceitar com a guarda muito mais baixa. E, por exemplo, se aceitarmos que o efeito do KT é pela estimulação sensorial estamos então lá na época da teoria das comportas no final dos anos 60, onde mal se conhecia o processamento da nocicepção e da dor no sistema nervoso. Acho que esse fato explica os resultados fracos em pesquisas sobre o efeito na dor pelo KT
Bom muitos colegas colocaram os resultados clínicos aqui para Dor, no entanto o questionamento que surge é o seguinte “o quanto diferente é colocar essa fita ou um esparadrapo” (clinicamente falando e não em termos de material). Ao meu ver a estimulação sensorial provocada pelo contato da fita com a pele pode trazer alívio de dor, mas esse alívio tem um forte componente de mascaramento, não trata a causa, a origem da dor. Mas o que mais me preocupa é o ponto de vista no qual os colegas argumentam , por exemplo: que os estudos para comprovar a eficácia da KT estão por vir, ou que tem estudos que mostram bons resultados. É bom deixar claro que estudos também possuem qualidade, podem até existir estudos que mostrem algum benefício, mas esse estudo foi bem elaborado? tem conflito de interesse? foi publicado em revista de qualidade? Submeter um paciente a um tratamento que não seja comprovado cientificamente, no sentido de que esse tratamento é melhor que o placebo, ou ainda utiliza-se do placebo como forma de tratamento é enganação e fisioterapia, pelo menos da forma ideal não deve enganar e sim tratar!
Com todo respeito discordo do professor Leonardo da Costa,pois sou golfista(Atual Bi-Campea do Estado do Rio de Janeiro)e pude comprovar a eficacia do KT,que diminuiu sensivelmente o desconforto de uma lesao importante adquirida na pratica do golfe.
Marleuza Cunha