Em um mês, 27 dias de cerveja; depois, uma meia maratona
09/06/14 18:07Eu tenho cá comigo que muitos corredores vez que outra se colocam a dúvida: se eu chutar o pau da barraca, será que consigo correr? Se eu não treinar nada ou quase nada, será que vou até o fim? Já fiz uma maratona sem treinar, mas não botei o pé na jaca…
A minha amiga LUISA ALCANTARA E SILVA, editora assistente dos cadernos Comida e Turismo na Folha –dá até para dizer que ela é uma turista profissional–, resolveu experimentar. Saiu de férias, divertiu-se à grande e, na volta, encarou uma meia maratona com chuva, vento e o escambau. Teve a grande ajuda da força de sua juventude e a sorte de quase principiante –tem 31 anos e já correu três meias maratonas, todas no calor do Rio.
Agora, foi desfrutar das belezas de outra cidade praiana,m a gloriosa Floripa da Santa e Bela Catarina. O resultado está neste texto que trago para você, direto da pena –melhor dizendo, das teclas—de Luisa, a quem agradeço pela colaboração. As fotos foram ela que mandou e integram seu Arquivo Pessoal. Começo, aliás, por compartilhar a bela vista da ponte Hercílio Luz, que ela e os demais participantes da prova tiveram antes do ínício da jornada.
E vamos ao texto de LUISA.
“Sábado, 21h. Tchau, gente, boa noite. Despertador para às 5h, ok? O grupo de dez mulheres de divide em três quartos. No meu, estou eu e mais duas.
“Ai, fulano que corre com a gente é uma graça. Mas é casado. E sicrano? Ai, essa novela é péssima, né? Nossa, 23h20, vamos dormir. Mais meia hora de fofoca e apagamos a luz.
“Estou quase embalando e o frigobar começa a fazer um barulho. Durmo um pouco. Acordo. Não quero olhar no relógio para não pensar que já é quase hora de acordar e não dormi quase nada.
“Descemos para o café da manhã e uma amiga mostra um vídeo feito minutos atrás, da janela do quarto dela. O vento batendo nas árvores assusta. Será que vai estar assim até a hora da prova?
“Às cinco e meia, o ônibus da Run&Fun, assessoria esportiva com a qual corro, passa para nos buscar. Quem vai fazer para tempo?, pergunta o treinador. Eu não levanto a mão. Nunca corri para tempo. Desta vez, então… Saí em férias um mês antes da prova e viajei por 26 dias. Treinei duas vezes em um mês. Tomei cerveja em 27 dias dos últimos 30. O treino longo, de 18 km, fiz sozinha e cheguei só até os 12. Fico feliz se conseguir terminar, falo para o treinador.
“A prova começa com alguns minutos de atraso. Antes do km 2, começa a chover. Uma garoa fina, boa para refrescar. Gente, estamos a 6’05’’, vamos diminuir. Ficamos em 6’30’’. Ai, por que inventei de correr essa meia maratona? Por que saí em férias bem antes da prova? Se eu tentar acompanhar minhas amigas nesse ritmo, não vou chegar ao km 10…
“No 4, após uma subidinha da ponte que leva do continente à ilha, fico para trás. Melhor, vou no meu ritmo. Só não quero andar. Parênteses: tenho a péssima mania de dar umas “andadinhas” em provas de mais de 10 km.
Vou entre 7’20’’ e 7’30’’.
“No km 6, nossa, oba, já dei duas voltas no lago do Ibirapuera (que tem 3 km)! Faltam sete… A chuva aperta. Será que vai acontecer como na meia do Rio, em 2012, quando meu tênis ficou encharcado? Ai, não… Aliás, já sabia que esse tênis, comprado em março, pega meu dedinho esquerdo, por que insisti em usá-lo? Porque custou US$ 115 e teria que ser útil… Ai, por que sou assim? Tenho cinco tênis, poderia ter usado um velho…
“Opa, já estou no km 9, preciso tomar o gel. Ai, que bom, pelo menos vou tirar um dos dois géis presos no meu shorts, porque eles estão incomodando. Eca, que gosto horroroso!
“Nossa, estou a 7’40’’, ritmo lento demais. Bora voltar para os 7’20’’, que já é devagar, mas menos devagar. Ai, que raiva desse cara que dá umas “andadas” e quando vou ultrapassá-lo ele volta a correr. Cruzo por minhas amigas, que já estão voltando. Gente, boa prova! Ai, se eu corresse rápido, já estaria mais próxima do final. Um casal que também corre na Run&Fun me ultrapassa. Bom, agora eu sou a última colocada da equipe, certeza.
“Km 11, já foi mais da metade. Nossa, mas ainda faltam 10 e mais uns quebrados… Será que vou conseguir terminar? Ai, vou dar uma “andada”. Não, já estou devagar, em ritmo quase andando. Vou tentar chegar ao km 15 sem andar e aí penso nessa possibilidade de novo.
“O shopping em que comemos doce ontem. Hum, uma paradinha não seria nada mal… Não, Luisa, o que é isso? Foco na prova, o shopping nem está aberto ainda, para de viajar!
“Km 15. Vai, vou continuar nesse meu ritmo “devagar-mas-sem-andar”. Ai, subidinha da ponte de novo. Corro uns 100 m de costas, para dar uma aliviada no músculo da coxa, que parece que vai sair para fora.
“Km 18, opa, só falta uma volta no Ibira! Mas eu sei que os últimos 3 km são os piores… Mas vamos lá, cheguei até aqui, vou até o fim. Ai, cadê o pórtico da chegada? Finalmente! Vou dar um pique e ultrapassar aquelas duas meninas.
“Ultrapassadas! Vejo meu treinador, Renato Dutra, dou mais um piquezinho. Pronto, acabou! Acabei? Acabei!!! Última da equipe, como previsto. Fiz a prova em 2 horas e 38 minutos.
“Para quem não entende nada de corrida, é um tempo péssimo; para mim, ok –foi, de longe, o meu pior tempo, mas estava sem treinar e foi o que consegui.
“Dor. Cansaço. Vontade de chorar. Missão cumprida. Felicidade. Partiu, cerveja!
“Depois de uma tarde de sequência de camarões e garrafas de Original, voo para São Paulo. Cama. Sono profundo. Na segunda, fico andando toda torta. Dor muscular a mil. Para descer os dois degraus do ônibus, quase precisei de um guindaste! E, embora eu tenha passado óleo, o sutiã assou minha pele.
“Mas valeu. E penso por que nós, corredores, gostamos tanto disso? Por que correr 21 km sob chuva me deixa feliz? De verdade? Não sei e não sei se existe uma resposta objetiva. Mas me deixa. O que sei é que daqui a um mês eu já vou pensar em fazer outra. Mas só daqui a um mês, porque, agora, ainda estou com muita dor!”
Rodolfo, tenho uma experiência parecida com essa: corri a Meia do RJ pela primeira vez logo após 15 dias de Lua de Mel em Mendoza – sendo que, na semana anterior ao casamento, não havia treinado por conta do imenso trabalho com os preparativos da cerimônia. Mas, como a Luisa diz, não dá pra responder de forma objetiva o que nós faz amar tanto o sofrimento das corridas, mesmo sem treinar. O fato é que amamos. ab
Luisa, me mande seu e- mail. Vamos marcar um treino..você vai se sentir “em casa” com minhas amigas atletas e cervejeiras. abraços e parabéns pela prova. kika
Parabéns pela prova e pelo excelente texto.