Na selva amazônica, corrida tem onça e picada de cobra
27/10/12 09:48Por profissão, Marcio Villar é analista de sistemas e vive mergulhado nos mistérios dos programas de computador e da vida digital. Nas horas de folga, porém, esse carioca de 45 anos assume a identidade nem um pouco secreta de ultramaratonista dedicado a desafios aparentemente irrealizáveis. Algumas emp acaba de dobrar a Jungle Marathon, correndo 509 km em15 dias.
Apesar do nome em inglês, essa ultra muito especial é realizada na selva amazônica. Na sua modalidade normal, tem 204,5 km e é realizada em uma semana. Por seus feitos anteriores, Villar foi convidado pela organização para tentar fazer a Jungle Marathon dobrada, ou seja, ida e volta. Foi providenciado um esquema de segurança especial para garantir a integridade física, sono e alimentação para o atleta, que começou o desafio uma semana antes, largando do ponto de chegada e seguindo em direção ao ponto de largada convencional.
No percurso, correu com uma onça ao seu lado, olho no olho por 40 minutos, e foi picado por cobra –as presas da serpente, porém, ficaram apenas na parte mais dura do tênis do corredor. Bom, já falei demais. Fique agora com o relato feito por Marcio. Ele começa com um resuminho da jornada e depois conta dia a dia.
“Corri primeiro da chegada para a largada, sozinho. Correr sozinho dentro da floresta amazônica é muito complicado, mas dia a dia fui vencendo os obstáculos.
Ao fim de cada etapa, eu dormia em uma rede colocada perto da casa do presidente da comunidade. Na etapa em que era possível encontrar onças – e eu as encontrei–, a organização mandou um guia armado para me acompanhar e proteger.
Não era fácil reconhecer o percurso. O o caminho era demarcado por fitas, porém eu tinha que ter muito cuidado porque elas foram amarradas para serem vistas por quem vinha no sentido contrário e muitas vezes não dava para eu ver de longe.
No segundo dia já dei de cara com uma onça, no quinto dia fiquei sem água e tive que beber água podre do pântano, mas no setimo dia quando cheguei ao fim da primeira parte do desafio e encontrei todos atletas que iriam correr a prova comigo me senti muito forte e com a certeza que conseguiria dobrar. Não imaginava, porém, que mesmo dobrando ainda assim chegaria em terceiro lugar . Tentei buscar o segundo mais um erro no caminho da trilha não deixou.
Se esses 15 dias fossem melhores estragaria, foi simplesmente fantástico e inexplicável, eu corria cantando e brincando.
Nos três primeiros dias, correndo solo, tive o apoio de Gilvandro Marcelo Santos Almeida, que foi o único que teve coragem de embarcar comigo nesse desafio.
Passamos por momentos difíceis, como no segundo dia, quando demos de cara com uma onça.
Cada etapa que completava me sentia mais forte. O que mais impressionava a todos é que eu acabava todo dia inteiro, sem dores musculares.
No fim da sétimo dia onde eu chegaria na largada da prova e encontraria todos atletas, ninguém acreditava que ja tinha fechado a prova porque estar muito inteiro.
Na prova normal depois, foi superação dia a dia, no oitavo e nono dia foi tudo bem, no décimo dia tive uma caída de rendimento depois do CP2 e foi para mim a parte mais difícil da prova, foi o único momento que achei que não conseguiria dobrar a prova.
Para piorar as coisas, por mais de 40 minutos corri entre o CP3 e CP4 com uma onça me acompanhando.
Peguei a faca na mão e teve momentos que tive que sair da trilha da corrida para tentar fugir da onça. Foi quando pisei numa cobra. Por sorte, ela mordeu a parte dura do tênis.
Fui na raça, tirando forcas de onde não tinha para terminar essa etapa, com muita dificuldade consegui finalizar e comi muito para me fortalecer.
O décimo primeiro dia terminei muito bem e me preparei muito para os dois próximos dias que seria a etapa longa de 108 km por charcos, praias, pântanos, trilhas e mata fechada.
O mais fantástico e inexplicável é que eu corria cantando e brincando, mesmo já tendo corrido por 11 dias, na etapa longa eu sabia que ali que era o pulo do gato: , se eu quisesse conseguir algo mais na prova que somente dobrar correndo os 509 km essa era a hora.
Um atleta chegou a comentar que eu estava tomado nesse dia, da largada ao CP5 eu me mantive entre os três primeiros, mas na chegada ao CP 5 fui ultrapassado por um inglês.
Ele, porém, demorou muito a sair do CP e aproveitei para recuperar o terceiro lugar e fui em busca dos dois primeiros. No CP8 cheguei a ficar somente 15 minutos atrás deles, porem entre o CP8 e CP9 peguei um caminho errado e perdi muito tempo e no CP10 estouraram duas bolhas na sola dos pés e tive que me contentar com o terceiro lugar.
Depois de cruzar a linha de chegada, passando uma meia hora que caiu a ficha e tive uma crise de choro que não parava: quando eu imaginaria, há 10 anos atrás com meus 98 kg, que um di a eu conseguiria dobrar uma das ultras mais difíceis do mundo correndo 509 km e ainda sim ficando em terceiro geral contra atletas de todo mundo.”
Exemplo de superação. Tive o prazer de ouvir algumas de suas histórias de Ultras na Ultra do CFN. Ele é o cara, parabéns pela força…
Nossa, em que parte da Amazônia foi isso? Alguma parte “intocada”? Só faltou esse rapaz encontrar o mapinguari.
Parabéns.
Impressionante o relato desta experiência! Correr no meio da mata, com onças, cobras e completando mais de 500km, não é para qualquer um! Parabéns ao atleta, verdadeiro campeão!