Corredor lento de Uganda acaba com festa dos quenianos
12/08/12 10:44Stephen Kiprotich, um garoto de 23 anos nascido no distrito de Kapchorwa, leste de Uganda, nem de longe era o mais rápido corredor entre os que se alinharam hoje na largada na maratona olímpica. Vergonha das vergonhas, o cara não tinha sequer sub2h07, marca já batida mais de 180 vezes desde 1988… Mas foi o campeão da maratona da 30ª Olimpíada, herói dos Jogos de Londres.
Festejando desde o km 40, foi com um sorriso enorme e a bandeira de Uganda sobre os ombros que ele terminou a prova (foto AFP), depois de ter derrotado o exército queniano e ter visto a armada etíope se estiolar ao longo do caminho.
Mais de três minutos depois da chegada de Kiprotich, finalmente o primeiro brasileiro aportou. Com dores e sofrendo por ter sido ultrapassado na alameda final, com cerca de 300 metros para a chegada, Marílson dos Santos completou em 2h11min10.
Os outros brasileiros também terminaram com bravura. Paulo Roberto de Almeida Paula, que esperava pelo menos ficar entre os 12 melhores (segundo me disse seu técnico), compeltou num belíssimo oitavo lugar. E Franck Caldeira chegou em 13º.
Foi bela a apresentação dos brasileiros, especialmente de Paulo Roberto, o único novato em olimpíadas, que comentou seu desempenho aos prantos, incapaz de conter a emoção represada ao longo dos últimos meses de sofrimento e incerteza (e por que deveria?).
Quanto aos vencedores, o momento de definição foi entre o km 30 e 35, quando Kiprotich, de Uganda, pareceu dar sinais de cansaço. Chegou a passar a mão no quadril esquerdo, supostamente indicando alguma dor. Naquela altura, Marílson estava na quarta posição, e os brasileiros que torciam por ele sentiram esperança de que o atleta verde-amarelo poderia chegar.
Pouco antes, na altura do km 29,5, ele tinha ultrapassado nada menos do que o jovem etíope Ayele Abshero, 21, que chegou a Londres sentado na marca de 2h04min23, prfimeiro lugar em Dubai. Marílson fora incentivado por seu técnico, que lhe gritara: “Tá quebrado lá na frente”, indicando que Abshero seria presa fácil.
De fato foi, mas o restante não seguiu o mesmo script. Na ultrapassagem, Marílson estava cerca de 40 segundos atrás dos líderes, diferença que só aumentou nos quilômetros seguintes.
Na guerra lá na frente, a aparente fraqueza do ugandês talvez tenha engambelado os dois quenianos que lideravam os trabalhos –Wilson Kipsang, dono da melhor marca pessoal entre todos os contendores (2h03min42) e Abel Kirui, campeão mundial (foto Reuters).
Pois metros antes do km 37, com o totem marcador da milha 23 quase ao alcance de uma batida de mão, Kiprotich deu o bote. Os quenianos não entenderam nada, e o ugandês não deu explicações.
Já disse aqui mil vezes que retrospecto não ganha jogo. Pois também não perde. O atleta de Uganda chegou a Londres com 2h07min50 de tempo de classificação, 2h07min20 de melhor marca pessoal. E, provavelmente, uma gana infinita de dar um pau em que estivesse na sua frente.
Ficou sempre no primeiro pelotão, mas sua liderança só foi ser registrada na marca do km 40, quando estava 19 segundos à frente de Abel Kirui.
Lá atrás, outro drama se desenrolava. Abshero caía de produção até não conseguir prosseguir, e os perseguidores atacavam. Com eles estava Paulo Roberto e, mais para trás, Franck Caldeira.
Franck, por sinal, fez uma festa na primeira etapa da prova, passou o km 10 em primeiro lugar, depois de jê ter feito uma escapada. Ele disse, depois, que estava fazendo sua corrida, que não foi nada demais, mas resultado apenas das variações normais de ritmo da prova, que ainda estava nos prolegômenos das ações mais dramáticas.
No km 36, o grupo perseguidor estava meio esgarçado. O japonês Kentaro Nakamoto e o norte-americano Meb Keflezighi (naturalizado; ele nasceu na Eritreia) travavam um duelo e se transformavam em caçadores de Marílson, que vinha perdendo terreno.
“A última volta foi de muita dor muscular”, disse depois Marílson, que afirmou terminar triste por não ter conseguido medalha, mas feliz por ter feito uma corrida cheia de bravura. “Nunca tive tanta raça”, afirmou.
Raça ou não, foi-lhe impossível resistir ao ataque do norte-americano medalhista olímpico (prata em Atenas-2004), que também acabou não ganhando nada, mas mostrou que tem seus brios.
Quem ganhou medalha, para que fique o registro, foram os seguintes: Stephen Kiprotich, de Uganda, ouro com 2h08min01, Abel Kirui, do Quênia, prata com 2h08min27, e Wilson Kipsang, também Quênia, bronze, 2h09min37.
Os brasileiros terminaram assim: Marílson, quinto, 2h11min10, Paulo Roberto, oitavo, 2h12min17, e Franck, 13º, 2h13min35.
Deles, sem dúvida Paulo Roberto foi o que terminou mais emocionado. Ao dar entrevista para a TV, não parava de chorar. Agradeceu à esposa, aos pais e familiares, à torcida brasileira. Lembrou sua luta incansável pela classificação, que fez com que esta fosse sua terceira maratona do ano, quarta desde outubro passado, o que é um esforço fenomenal para atletas de elite. “Dei o sangue para ficar entre os 12”, disse o corredor paulista de 32 anos, que conseguiu bem mais: ficou entre os oito melhores maratonistas olímpicos do mundo.
Foi EMOCIONANTE!! Parabéns aos campeões e aos nossos guerreiros que não ganharam a medalha mas fizeram bonito!!!
Uma dúvida: Os participantes que completam a prova nas olimpíadas (não só nas corridas, mas em todas as outras modalidades também) não recebem uma “medalha de participação”??
Não, Priscilla. Simplesmente estar lá já é honrta e gloria. mas alguns países recompensam seus atletas olímpicos de diversas formas, mesmo que não saiam de lá emedalhados
Realmente a participação dos brasileiros na maratona foi excelente, comparável à do Quênia ! Os etíopes todos abandonaram….esperava-se uma luta entre eles, mas esse cara de Uganda surpreendeu ! Parabéns a todos. Devia haver uma medalha por equipes, coisa assim. O Brasil ficaria no pódio.
Rodolfo, Na sua opiniao, deu zebra na Maratona, ou as 90 curvas foram fator decisivo para um desconhecido ganhar a medalia de ouro. Fiquei sabendo que o corredor Paulo Roberto e treinado a distancia por um tecnico brasileiro residente na China
Oi, Luis. Como disse Marílson, na maratona tudo pode acontecer. O corredor de Uganda não estava cotado entre os favoritos por não ter um “bom” recorde pessoal, mas soube economizar energia. O~calor tam,bém pode ter afetado o desempenho dos supostamente melhores…
Excelente análise.
Esta análise aqui, do Renato Canova, treinador italiano que trabalha no Quênia, complementa a sua. Ele diz que o cara de Uganda ganhou porque teve mais tempo para treinar:
http://www.albertostretti.org/2012/08/marathon-mendeep-analysis-by-renato.html
Se isso for verdade, o Brasil tem que ter estratégia semelhante para 2016, não acha?
Bom, de fato Kiprotich teve mais tempo de recuperação do que Kirui e Kipsang, mas acho que isso, sozinho, não explica tudo. Paulo Roberto, pro exemplo, teve muito mais desgaste do que a maioria do dos maratonistas de elite (que em média correm duas maratona spor ano) e se saiu muito bem. De qualquer forma, tenho certeza de que, competindo menos e podendo focar melhor nos alvos mais importantes, qualquer corredor (e não só os de elite) tem condições de apresentar melhor desempenho.
Coisa linda e de chorar a emoção de Paulo Roberto de Paula em seu depoimento ao final da prova! Em uma ótima colocação, esse é o esporte: vencer a si mesmo e superar-se, ainda mais sendo atleta no Brasil pois todos sabemos das dificuldades q enfrentam. Lindo, lindo, lindo. Vale tanto como ouro! Parabéns aos brasileiros!
Quais dificuldades que passam Marilson e Franck ?
Rodolfo, eu achei sensacional a participação dos brasileiros! Parabéns a todos eles; deram raça e honraram o país! Infelizmente não veio medalha, mas eu pelo menos me surpreendi demais c/ as posições. Abc, Augusto.