Corrida fala de paz, mas Morro do Alemão segue violento
27/07/12 12:35O fuzilamento da PM Fabiana Aparecida de Souza e os choques entre polícia e traficantes que se seguiram ao longo desta semana, no Complexo do Alemão, mostraram que a região está longe de viver em paz, como festejou uma corrida no final de maio.
Era o Desafio da Paz, que eu acompanhei então, me perguntando sempre se aquilo não seria uma comemoração prematura. Para o secretário da Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, que correu os cinco quilômetros da prova envergando o número 171, perguntei se a paz não continuava a ser um desafio.
Sem muita firula, confirmou que a pacificação da região –um conjunto de 13 favelas que é uma das áreas mais pobres e abandonadas do Rio de Janeiro—era uma obra em andamento, que precisa ser conquistada a cada dia.
Na largada, porém, na manhã domingueira, a praça de esportes da Vila Cruzeiro em nada lembrava a área conflagrada de um ano em meio antes. Foi na região da partida da prova que, em novembro de 2010, aconteceram os choques entre policia e traficantes, que fugiram então em direção às quebradas do Complexo do Alemão.
No dia seguinte, o Brasil acompanhou os combates entre forças de segurança e bandidos, que acabaram expulsos, usando trilhas da mata como rota de fuga (AQUI, uma galeria de fotos da época).
Nós, os corredores, subimos o morro passando exatamente pela estrada de terra usada pelos traficantes para escapar do cerco.
“Foi nessa curva que o vagabundo foi acertado”, me diz um morador do Alemão, lembrando a cena vista por centenas de milhares de pessoas pela TV: o bandido é fuga é atingido por um tiro disparado de longe. Cai ao chão e é arrastado por seu companheiro até um local seguro e então é levado para fora da área dominada pela polícia.
Subimos até o ponto mais alto da região e então começamos a descida pelo meio da favela. Levo uma minicâmera na cabeça, enquanto um colega cinegrafista busca cenas diferentes para o vídeo que afinal foi apresentado no programa da Folha na TV Cultura (veja o filme AQUI).
Desço pelas quebradas, que parecem estar em paz. A tensão, porém, é clara. O cinegrafista Felix Lima, correndo entre os barracos, ouve de um sujeito que enrola um baseado: “Olha aí, Tim Lopes!”.
Ao desavisado, pode parecer cumprimento amistoso, mas é bom lembrar que Tim Lopes foi o jornalista sequestrado e morto pelo tráfico, em junho de 2002, quando buscava informações para uma reportagem sobre a criminalidade no Complexo do Alemão.
A irmã de Tim, Tânia, estava na área da chegada da prova. Convidava a todos para uma cerimônia de homenagem à memória do irmão que seria realizada ali mesmo, no Campo do Sargento, no fim de semana seguinte (foto Cecilia Acioli/Folhapress; saiba mais AQUI).
Naquele domingo, apesar da tensão, o clima era de festa. Entrevistei rapidamente alguns moradores da região, e todos afirmavam que a situação estava tranquila, que havia paz. Alguns preferiam virar o rosto, engrolar palavras, não dizer coisa nenhuma: era a indicação de que, corrida ou não, a paz continua sendo um desafio no Complexo do Alemão.
PS.: Confira outros vídeos que produzi para a TV Folha:
Corrida das dondocas, AQUI
Primeira corrida na Rocinha, AQUI
Entrevista com Adriana Aparecida da Silva, AQUI
Novo percurso da São Silvestre, AQUI
Antes da TV Folha, comentário sobre maratona, AQUI